Lá vai ela mais uma vez, buscando
metades de amor, amores de segunda mão. Lá vai ela novamente, tecendo ilusão,
aceitando a breve participação de alguém a quem ela conseguirá enganar por um momento. É sempre a mesma dança: ela escolhe uma presa e a faz acreditar que
ela é boa, amável, santa. Por uns poucos segundos constroem um castelo em
pilares de areia. Pesado e frágil. Grandioso e passageiro. Ela se molda por
fora em argila de maneira impressionável e impressionante. E quando resseca,
racha e desmancha, revela-se oca; sobram restos em pó e vento.
A pobre coitada se faz de vítima,
mas é aberração. Aberração que atrai e coleta frágeis almas , pertencentes a
outros amantes, para destruí-las de vez. E o que é pior, ela não se alimenta
disso. Na vida conseguimos ao menos justificar, por vezes seguindo de perdão,
os selvagens que destroem para sobreviver. Mas não ela. Não há sequer prazer no
porquê ela segue com essa coreografia. Se é que há um porquê. Destruir por
destruir, usar sobras de amores alheios, é só o que ela sabe fazer. Talvez seja
o ódio de si mesma (sempre muito bem escondido do outro e facilmente acessado
por ela) que faça com que ela roube e destrua a pequena fresta de esperança enxergada
nos outros. Suas vítimas são sempre as que já foram previamente detonadas por
outras coisas. Sempre almas que se seguram por um fio, que ela não apenas corta
com crueldade de Moira, ela dilacera. Os espectadores também compram a cena
toda, assombrados, admiram sua persistência. Não notam o rastro podre que ela
deixa, não percebem o nada de que ela é feita. Por vezes engana até a si mesma e chora
lágrimas rasas. Lágrimas de quem usurpa acreditando ser feita para a
originalidade, acreditando ter apenas tomado posse do que de fato lhe pertence
e nada mais. Até que superficialidade de
seu pranto a lembra de que nada é dela e só o nada a pertence.
Estranho. Desta vez, despejei lágrimas cheias.
"Sinto que é como sonhar
Que o esforço pra lembrar
É a vontade de esquecer
E isso por quê?
Diz mais"
(O Vento - Los Hermanos)