
Sempre me dei muito bem com a solidão. Não há quem me conheça melhor do que eu mesma; e ainda assim quando me vejo sozinha e me pego conversando comigo, acabo por fazer algumas descobertas interessantes sobre minha própria personalidade e, fazendo reflexões profundas de momentos passados, vejo onde errei na minha vida. Além disso, minha imaginação sempre foi extremamente fértil; então monto mil cenários na minha cabeça quando me falta companhia. Assim sempre me distraí muito bem. No entanto, por mais que eu sempre diga que me basto, quanto mais tempo fico só mais sinto falta de alguma coisa. Não é cada vez uma coisa diferente, não, é sempre a mesma coisa. Nunca a havia encontrado, até aquele dia; naquele domingo quente de fevereiro, naquela cidade imensa, debaixo daquele sol ardente, entre as árvores daquele parque estranho. Olhei em teus grandes olhos e eu, que por tanto tempo tive apenas a minha companhia, encontrei pela primeira vez aquilo que sempre me faltou e nunca soube nomear. Consegues compreender a minha tristeza ao descobrir que não encontraste a mesma coisa em mim? Entendes por que me entristeci tanto desde aquele dia? Aquela foi a última vez que soube o que era sorrir da forma mais completa. Um sorriso de fato sincero, pois não me lembrava mais do mundo; não sabia que existiam outras pessoas. O egoísmo da minha felicidade isolou-nos de tudo e assim soube que contigo sim teria tudo o que eu precisava. Como posso desistir? Depois de passar tanto tempo sentindo falta daquilo que encontrei contigo, como deixar para lá? Quão cruel é poder ter apenas um dia com aquilo que passei toda uma vida procurando. Agora que sei o nome do que pertence a esse vazio que sinto, a dor de não tê-lo e a falta que fazes é ainda maior. Minha mente, que tanto admira a tua, sente falta de como a estimulas. Meu corpo inteiro pede por você. Agora que minha pele conhece o calor do teu toque e meus lábios sabem o gosto dos teus, nenhum outro parece se encaixar. Em meu seio ainda sinto a firmeza da tua mão e meus olhos ainda sorvem a intensidade dos teus. Quão irônica é essa chuva maldita que não para de cair. Ela que somente me lembra que nunca mais sentirei o mesmo calor daquele dia. Nunca antes havia ansiado pelo sol a arder em minha pele. Nunca antes havia sorrido tanto em um dia tão quente. Cada barulho de cada pingo d’água apenas me impede de esquecer que nunca mais terei aquela mesma felicidade. Que nunca mais o verei.
Desvanecer
Cruel é dar esperanças
a quem não deveria as ter.
Cruel é selar um pacto
e não conseguir manter.
Selaste-o quando os nossos
olhares se encontraram.
Quando os nossos lábios se juntaram
e perdemos, juntos, a noção.
De que havia um mundo lá fora
sem lugar para nós dois.
Cruel é me dar
o que tanto desejei,
porém envolto
em breve bruma de ilusão.
Cruel é me fazer crer
que a mim pertencia
algo que nunca sequer existira
e nem viria a existir.
Cruel é dizer “vem”,
mesmo sem nada pronunciar,
àquela acostumada a persistir.
E então desaparecer
sem ao menos um adeus.
Cruel é ser frio
sem nada falar.
E machucar sem cortar.
Cruel é nem ao menos o extrair
com um corte limpo
que rapidamente se cure.
Cruel é abrir essa ferida repugnante
a unhas e dentes;
infeccionando-a
com esse liquido peçonhento
feito do teu silêncio,
impedindo-a de cicatrizar.
Cruel é encher meu seio
com esse ardor
que há muito quis;
para então deixar-me presa
entre essas paredes gélidas.
Cruel é me fazer sentir
para em seguida marcar tua indiferença
tão profundamente em mim.
Cruel é nunca escolher.
Érica Pierre Costa